24 de outubro de 2011

A morte de Kadafi e a questão: como se matar um ditador?

A humanidade tem umas coisas esquisitas. Por exemplo: existiu, durante muitos séculos, uma literatura voltada para as formas do bem-morrer. Ensinava-se a maneira mais adequada para se passar dessa para outra (melhor? pior? igual?). Na idade média, o ideal era morrer de forma lenta e até dolorosa, expiante. Hoje existe um sonho macabro: morrer subitamente, morrer enquanto dorme (o que duvido que seja possível, mas que, certamente, produziria a desconsertante sensação de "acordar morto"). Na idade média, ao contrário, seria signo de azar morrer dessa forma, pois qualquer um poderia ser tocado pela morte em momentos de pecado, além de não sobrar tempo para o arrependimento, a última confissão, etc.
Nos últimos tempos a história ganhou um novo capítulo: como se deve matar um ditador ou terrorista (ou os dois ao mesmo tempo)? Adolf Hitler sumiu do mapa, deixando apenas o contestável vestígio de seus dentes.  O Sadam Hussein foi enforcado, de barba e tudo, gerando desconforto e embrulho de estômago. O Osama jaz insepulto no mar, não houve espetáculo de seu corpo, oque gerou desconfiança e teorias conspiratórias. O Kadafi, segundo indícios, foi torturado pelos responsáveis por sua captura. Além disso, ficou exposto, gerou memória visual, sentimentos de horror por parte de uns e de admiração por parte de outros. Agora há toda uma discussão internacional para se saber se houve crime de tortura, violação de direitos humanos, etc... A conclusão que se tira disso tudo? É que a morte perturba, causa espanto, escandaliza. A morte de quem amamos, a morte de quem não sabemos, a morte dos que nos matam. Heróis ou criminosos, todos tem a sua morte. Sinistra herança. Não se sabe como se deve matar um ditador, mas eles estão aí, morrendo de todas as formas, aumentando o repertório.

Bruno Silva

1 comentários:

Walter disse...

Engraçado que Juan de Mariana (jesuíta espanhol que viveu entre 1536-1624) dizia que o único meio ilícito de se matar um tirano seria o envenenamento, porque geraria um "suicídio", e tal morte é condenada pelo cristianismo. De resto, bastaria a opinião geral de que o Soberano era tirano para deflagrar um atentado contra a sua pessoa, pelas mãos de qualquer particular. Como vemos, o governante não teria tempo para a extrema-unção...

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