23 de janeiro de 2012

Niilismo em raso mar!

Bela Foto de Satélite do Naufrágio
Contraste entre o Colosso e as Comuns Embarcações










O Cruzeiro Concordia desrealizou o seu nome: indignação comungada como uma missa, heroicização da pessoa que cumpria docilmente sua função. Há algo de recusa hierárquica na atitude do comandante do navio, de não se submeter a ordens de alguém da capitania dos portos. Há também, quiçá, qualquer coisa de simplesmente intangível no abandonar do navio pelo comandante: cito aqui Bukowski, não para justificar tal ato - Bukowski nunca será citado por um advogado num tribunal real - mas para compreender, se foi mesmo isto que ocorreu:

"Andava com mania de suicídio e com crises de depressão aguda; não suportava ajuntamentos perto de mim e, acima de tudo, não tolerava entrar em fila comprida pra esperar seja lá o que fosse. E é nisso que toda a sociedade está se transformando: em longas filas à espera de alguma coisa. Tentei me matar com gás e não consegui. Mas tinha outro problema. Levantar da cama. Sempre tive ódio disso. Vivia afirmando: 'as duas maiores invenções da humanidade foram a cama e a bomba atômica; não saindo da primeira, a gente se salva, e, soltando a segunda, se acaba com tudo'. Acharam que estava louco. Brincadeira de criança, é só disso que essa gente entende: brincadeira de criança - passam da placenta pro túmulo sem nem se abalar com este horror que é a vida".


Fiquei refletindo sobre isso quando imaginei a cena do comandante em seu bote, num momento de epifania, olhando fascinado e hipnótico para o navio a naufragar, um colosso afundado por "simples" pedras drummondianas (que agora o sustentam, evitando seu pleno afundamento), negligenciando auxílio aos passageiros em filas pânicas, em seu horror à mutação ligeira daquelas pessoas dantes civilizadamente, irrefletidamente, felizes. Não consigo esconder em um de mim (qual, quain?) uma certa simpatia por ele. Crucificar-me-ão, claro, reação instantânea, e por isso instintiva e impensada.

Walter Andrade

PS: Vi o anúncio nos cinemas de que a versão em 3D de TITANIC será exibida. Estranha "coincidência casual", ou propaganda real para um filme baseado em fatos reais, que reeditará numa dimensão a mais o esplendoroso sucesso de bilheteria!

1 comentários:

Bruno Silva disse...

Eu fiquei pensando: rodovia mata e horroriza, avião mata e vaporiza, o mar assassina e sopra brisa. Haverá viagem segura? Mas e os que morrem em casa, de acidente ou de destino? A vida é dangerosa. Quanto ao capitão, se fosse um português ou se tivesse a alma lusitana desse texto, talvez dissesse: "navegar não é preciso; viver é preciso". Mas então ele seria um português ao avesso, invertendo a máxima dos navegadores antigos evocados por Pessoa. Na verdade, o capitão só quis "mantenere suo stato". Esse...

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