21 de dezembro de 2014

As palavras que eu diria

Recentemente um amigo meu, dos antigos, passou por uma dor daquelas para as quais não há remédios: a perda de sua mãe. Não pude estar com ele nos momentos difíceis que se seguem a um acontecimento trágico como esse. Eu mesmo estava imerso em outra tragédia familiar quando tudo aconteceu. No entanto, fiquei pensando nas palavras que eu teria para dizer ao meu amigo, no afã de (será possível?) aliviar sua dor. Ocorreu-me relembrar a esse amigo o significado daquilo que sua vida foi para sua mãe. Diria que seguramente sua mãe jamais teria desejado a inversão da ordem natural (é triste considerar, mas são os filhos que devem ver seus pais partirem, jamais o contrário!). Cumpriu-se, mesmo de forma antecipada, a ordem natural dos acontecimentos. Mas nós sabemos que essa constatação não basta. Eu...

20 de outubro de 2014

A lição de 1989

Em 1989, um "resumo" do debate da globo, apresentado no Jornal Nacional, favoreceu sensivelmente Collor, candidato pelo PRN, contra Lula, do PT. O caráter da emissora, já se sabe, não inspira confiança em um trabalho sério e imparcial. Sua convivência simbiótica com a ditadura militar (mas também civil e empresarial) já constitui um cartão de visitas às avessas. Essa tradição de fechar o ciclo de debates políticos é celebrada pela emissora, bem vista por determinado setor da sociedade e, com razão, receado pelos que estão atentos e sabem o quanto têm a perder com uma eleição marcha à ré. Os escândalos que são alardeados em momento propício, os que são abafados e pintados de marrom, tudo isso constitui um modus operandi para lá de denunciado...

8 de outubro de 2014

Apoio Crítico

Há uma agremiação política fundamentalista que a história não nos conta e o jornalismo nos oculta. É a mais antiga do país, irreprimível, perene. É o PQPM, Partido do Quanto Pior Melhor. "É que a TV [o jornal do partido] me deixou burro demais, e agora todas as coisas que eu vejo me parecem iguais" Você que conquistou uma bolsa de mestrado (e temos até o mestrado profissional, voltado parra os que já lecionam), que comprou Sua Casa, Sua Vida  [inteira pagando sua casa] - mas que, afinal, a tem -, que entrou na universidade pública pelo ENEM, que hoje, COM TUDO, come bem; que tem aumento anual do salário mínimo (alto demais, segundo economista do PSDB), vê as obras de transposição do Rio São Francisco... (apesar do obséquio), pare de dizer que NADA do que vê nas eleições veio! Deixe esse...

6 de outubro de 2014

O analfabeto funcional da política

O pior analfabeto, diz o conhecido texto de Bertold Bretch, é o analfabeto político... acrescentaria que, ao lado dos que não se interessam pela política, estão os analfabetos funcionais da política. Inocentes úteis que papagaiam discursos de uma elite à qual não pertencem, mas da qual talvez almejem participar (e até, talvez, já se acreditem participantes), esse grupo numeroso de porta-vozes do retrocesso, que condenam socialmente movimentos sociais, que bradam gritos de uma pretensa moralidade política (que por alguma razão, ou desrazão, acreditam faltar ao PT e sobrar ao PSDB), representam um mal igual, senão maior, aos que (pensam que) não estão nem aí. Você que estudou em faculdades particulares, porque o FHC, doutor...

17 de abril de 2014

Réquiem para Gabriel García Márquez

Fui recebido pela esposa, mal cruzada a soleira. - Hoje você vai precisar tomar um trago. Seu escritor favorito morreu... -Gabo?! É véspera de Sexta Feira Santa: Quinta de Endoenças, último dia de missa antes da vigília pascoal. Gabriel García Márquez está morto e será preciso um copo cheio para engolir o passamento do santo ateu, exatamente como Jeremiah de Saint-Amour. Sentei para jantar. Jantei. Fiquei pensando no Gabito, na minha vida e juventude, nos meus amigos. Quando o Saramago se foi, alguém falou que o mundo havia ficado mais burro. Agora, não apenas está mais burro, como mais desprovido de fantasia e realismo. De realismo fantástico. Parece que estamos, mais uma vez, à nossa própria sorte e miséria... Bruno Si...

21 de dezembro de 2013

Relógios e calendários

Desconfio de relógios Absolutamente, não confio em calendários O tempo é matéria enganosa, fluida Toda tentativa de sua exata medição é um fracasso Quinze minutos de sono, quinze de engarrafamento: Quem dirá que duram o mesmo?! Assim com as horas, assim com os anos Uns voam, outros se arrastam Este 2013, para mim, não tem medida: Foi longo porque cheio, breve porque acelerado Mudei, casei, fui pai Ao mesmo tempo fui filho, colega, amigo, genro... Tantos papéis desempenhados, espaços ocupados Fiquei uma década sem ver pessoas queridas Pessoas que, até ontem, estavam ao lado Como medir? As vezes, dobrando uma esquina, virando um gole, ouvindo uma canção Eu me transporto para outro tempo, fisicamente Não é a memória, apenas: sou eu, lá Calor ou frio, maresia ou vendaval É meu corpo novamente,...

12 de dezembro de 2013

A enchente é um fenômeno político

Por que será que, ano após ano, as enchentes "surpreendem" as autoridades? A Rede Globo, por exemplo, começou a se tornar o que é graças à cobertura ao vivo que realizou sobre a fatídica enchente de 1966. De lá pra cá, entre dezembro e março sempre tem Natal, Inundação e Carnaval!  Ninguém deveria se demonstrar surpreso com os cataclismos estivais! Tudo colabora para sua ocorrência: fatores meteorológicos, sócio-econômicos e, principalmente, políticos. A enchente é um fenômeno político: o sistema de drenagem insuficiente (ou sua não-existência), a ausência de políticas habitacionais, a vista grossa para o arrasamento da natureza pelas grandes empresas que destroem os rios (destruindo suas matas ciliares). Tudo isso está diretamente...

24 de outubro de 2013

Nem na Ditadura...nem na ditadura?

"Nem na Ditadura se fez isso, nem na Ditadura se teve coragem de...". A intenção aparente e profunda é, provavelmente, desnudar o autoritarismo de Cabral, Paes, mesmo da Dilma, pela via da comparação. Mas a ambiguidade... É preciso a cautela do historiador aqui: entre 1964-1989 não existia celular, câmeras digitais, Mídia Ninja (!), muito menos a cinemania generalizada atual. "Uma câmera na mão e uma ideia na cabeça" era coisa incipiente... Imagina-se então quantas arbitrariedades sem testemunhas ou provas...? (Imagine mesmo); a "facilidade" de se debater ideias, em público ou não? de se manifestar? (Se hoje os Black Bloc's se mascaram, os militantes de outrora faziam até cirurgias!). Prenderam manifestantes pacíficos na porta da Câmara...

19 de setembro de 2013

Pizzas, ratos e Coca-Cola

Walt Disney e Coca-Cola: dois símbolos da cultura dos USA. Imagine o Mickey Mouse bebendo Coca-Cola. Imaginou? Agora imagine a cabeça do Mickey dentro da garrafa de Coca! Isso nada tem de Tio Sam! Absurdos como esse são reservados para uma geração Coca-Cola de terceiro mundo! O caso do consumidor que contraiu graves problemas de saúde após ingerir o refrigerante de uma garrafa que continha pedaços de rato, recentemente divulgado na grande mass media, gera indignação geral e doses de humor negro (humor caramelo IV, para ser mais exato!); mas a piada é, também, uma forma de protesto. Um tratado filosófico não geraria a mesma comoção que um meme nesses tempos de internet. A mensagem, por incrível que pareça, pode dizer tanto mais quanto...

14 de agosto de 2013

Meu evangelho particular

The promised child Shines in a baby's eyes All nations sing  Let's harmonize all around the world (Michael Jackson - History) Evangelho, sabe-o até o mais empedernido rival do cristianismo, significa "Boas-novas": narrativas religiosas que dão notícias do advento de Jesus para a salvação da humanidade. Outra característica do Evangelho diz respeito às diversas profecias anunciadoras do messias. No meu evangelho particular eu falo da vinda de uma outra criança (sem estrela, presentes e reis magos), sem escritos anteriores que nos antecipassem sua chegada redentora: minha filha Marina! "E sucedeu por aqueles dias que, tendo percorrido quanto alfarrábio conhecesse, nada pode encontrar que lhe dissesse claramente, ou mesmo insinuasse,...

24 de julho de 2013

A Poesia devassa a Política

Há uma Violência Normal Monopólio Legítimo Estatal, é Natural a Pena Capital aos deserdados do mundo, As fichas de Delinquência "juvenil" que tombam (Amarildos?) no chão do Purismo da Vida como Imaculada Duração Armas Químicas encenam uma guerra duplamente biológica Lacrimogêneos, Bombas de Efeito mais-que-moral, Spray de Pimenta nos olhos alheios como Refresco. GUERRA CIVIL PACIFISMO gera MILITARISMO... [Ah!] Só o Amor (à Mammon) Constroi! Obrigado pela Solidariedade (aos Ricos & Segurados) Brindemos ao Socialismo das Classes Meio-Altas! (Nas seguintes noites gélidas os mendigos do Leblon agradeceriam a um Deus Silencioso a Moda Outono-Inverno da Empresa Saqueada, parecendo-lhes Providencial a Frente Fria tardia em Julho) Espionagem interna, inimigo à paisana, Sabá de Estados...

21 de julho de 2013

Poema Gullar

Encho um copo com Whisky de Morais Atiro-me no sofá Drummond de minha sala ampla: Eu vou escrever um poema Gullar Procuro, em minha Bandeira infância Algum fragmento de Pessoa Uma Quintana de inspiração qualquer Nada vem, de abstrato ou concreto Nada vem Nada v Em N A D A Nada Reverbera, no fundo de meus ouvidos,  Aquela sonoridade Jobim Se nada funciona por aqui Pego hoje mesmo um avião E mudo-me para  Hollanda Bruno Silv...

19 de junho de 2013

Fora do campo, no meio das ruas

Entre o Redentor e a Igreja da Penha iluminada Chego na Ilha do Governador Como a avenida Brasil é grande, meu Deus! Estou entre dois símbolos piedosos E meus iguais, a esta hora, marcham nas ruas Há um rio de refresco correndo pelo país: Pimenta nos olhos "Em meio a tantos gases lacrimogênios..." Penso na multidão anônima dos que, de joelhos, subiram os degraus da ermida Eis que, agora, outros sobem de pé a escadaria da Alerj, O Congresso Nacional, E tantos outros lugares aos quais, de ônibus, jamais alcançaríamos. Bruno Silva...

13 de junho de 2013

Na pista contra o negócio

Vândalos era o nome de um povo germano que por ter invadido o Império Romano (como outros tantos povos germanos à época) tornou-se termo pejorativo (somos herdeiros da cultura greco-romana né). Mas ladrão que rouba ladrão tem 100 anos de perdão (afinal os territórios romanos eram conquistados à outros povos também...). E é no fundo linguístico e além dele que essa romanidade receia ter seu domínio contestado pela "plebe" nas ruas brasileiras (o Rio já foi chamado de A Nova Roma séculos atrás). O vândalo agora é inimigo interno (?). Intifada nas ruas contra a ação repressora policial e reclama-se que os "manifestantes não respeitaram o patrimônio histórico", ora, querem que "gases lacrimogêneos fiquem calmos..." fora da canção! (que...

9 de junho de 2013

Falecido conto do vigário, conto do Vigário falecido, sei lá...

Foto tirada no São João Batista. Cristo Redentor ao fundo.  Morar na área nobre do Rio não é nada barato, como já sabemos. Ter o direito de dividir espaço com as amendoeiras, na Zona Sul,não é para qualquer mortal. Nada de surpreendente nisso. Agora, fui tomar conhecimento de que a vizinhança com as raízes do gramado também não é para qualquer defunto: o preço de um jazigo perpétuo no São João Batista - em Botafogo -pode chegar à vultuosa quantia de 300 mil reais! Assustou? Então imagina isso: seus ossos descansando aristocraticamente no cemitério carioca e, de repente, não mais que de repente, para citar Vinícius de Moraes (que aliás jaz no São João Batista, assim como Tom Jobim, Drummond e tantos outros), sendo exumados sem autorização...

16 de maio de 2013

Desculpe incomodar sua viagem

O sujeito entra no ônibus e permanece de pé, fitando os passageiros. Depois de uma breve pausa, começa a falar: - Boa tarde, senhores passageiros! Desculpe incomodar o sossego da sua viagem. Eu sou ex-presidiário, paguei meu débito com a sociedade e estou aqui para saber se algum dos senhores pode me abençoar com uma oportunidade. Muitas vezes o ex-presidiário volta a cometer crimes, a roubar, porque a sociedade não lhe dá outra oportunidade. Eu estou aqui para pedir esta oportunidade para os senhores. Quem puder estar me abençoando com qualquer quantia, que Deus o abençoe. Aqueles que não tiverem como ajudar, que Deus abençoe também. Esse dinheiro, senhores passageiros, será para comprar balas e doces para vender nos ônibus, podendo, assim,...

7 de maio de 2013

As Guerras das Coreias

É isto a animalização do homem, parece gado abatido. Eu não gozo com isso... A preocupação das últimas semanas com a possibilidade de uma guerra nuclear (finalmente, diriam os de humor negríssimo!) entre a Coreia do Norte e os E.U.A cedeu lugar na semana em que vivenciamos à descoberta da geopolítica na Coreia do Oeste. É, fica ali, no Extremo-Oriente, próximo a Bangu. Só que o caso não abalou só Bangu, mas a opinião pública carioca como um todo. As pessoas em sua maioria estão indignadas! E com a Globo, vejam vocês, só que pelo motivo errado (ou desumano). Muito me intriga as (des)razões escusas da emissora ao transmitir tais imagens, aliado a um frenesi da violência real mas que, com aquela câmera térmica, mais parece uma sorte de GTA:...

16 de abril de 2013

Maioridade penal no Brasil?

Maioridade penal no Brasil é questão para debates acalorados. Toque no assunto quando estiver em uma mesa de bar com seus amigos e lá se vai a noite por água abaixo! Periga até sair briga no boteco, com polícia convocada e todo mundo indo parar na cadeia (pense bem: um bando de marmanjos em plena maioridade penal trocando tapas quando os argumentos já não bastam). Existem algumas formas distintas e talvez complementares de se enxergar o problema. Em primeiro lugar: o que fez e continua fazendo com que a juventude ponha uma pistola (real ou de brinquedo) na mão e saia para o ganho nas ruas? Em algum momento, parece, alguém não cumpriu seu papel (pais, Estado, etc.). Podemos nos perguntar o porquê dessa omissão, e o texto não acabaria mais....

8 de abril de 2013

Nonsense com 40 anos de Dark Side

Storm Thorgerson (Storm Studios)(c) Pink Floyd (1987) Ltd/Pink Floyd Music Ltd.O histórico álbum Dark Side of The Moon completou recentemente 40 anos. De 24 de março 1973 até hoje foram vendidas mais de 50 milhões de cópias do disco, que trata das loucuras modernas, como o tempo, dinheiro, esquizofrenia, vida e morte. E o triângulo simboliza a ambição e o pensamento.  O branco assusta. E a despeito da (cons)ciência de sua cobertura das cores outras. Do prisma floydiano. Mas o branco, se absorve, também oprime. Se é folha para a escrita, afugenta-a. Lugar para a inscrição da memória? amnésia. Traz-nos a sensação própria do vazio, que se transporta ou vincula ao nosso e do mundo, criando ligações angustiantes. Até que se a preencha...

21 de fevereiro de 2013

Fevereiros idos

Sempre que chovia em fevereiro parecia que a natureza ofertava um imerecido carinho. De tanto sol, que também não se merecia, vinha um riachinho de pé abençoar os bichos e as plantas. Chovendinho. Naquele não choveu, não. Era o sol, como uma rodela de abacaxi sobre o triste povo nosso. O caminho de barro malsão, dava o tempo de empapar os corpos, de grudar as vestes e, de repente, lufada de poeira. Era uma raiva e uma tristeza, tudo junto. Triste travessia nos fevereiros idos! Chuva não dava sinal, e quando viesse era mais para desespero e desalojo. Tinha urubuzal no alto, devia de ser res morta. Não era. Cheiro paposo, daqueles que os lixos e os mortos dão, depois de envelhecidos. Eram os idos de fevereiros. Tempo melhor há de vir, sem dar aviso. Aí vai ser uma fartura de chuva prazenteira,...